sexta-feira, 29 de julho de 2011

Escrito 2

Uma vez, um moço que tocava violão me falou que o amor são pequenas lagartas que moram em nosso estômago e que devemos mantê-las sempre lá. Fiquei me perguntando sempre porque deixá-las guardadas se elas são criaturinhas tão pequenas, rastejantes e inofensivas... Depois de tanto refletir sobre isso, resolvi deixar algumas pequenas escaparem de propósito, com muita diligência.

As pequenas danadas, assim que viram a luz do sol, transformaram-se imediatamente em borboletas lindas de asas coloridas e aspecto amigável. Voavam livremente pelos ares acessíveis e sempre me traziam, ao final do dia, agradáveis aromas florais.

Mas.... uma pequena rastejante permaneceu em meu estômago, eu tinha me esquecido de libertá-la. Ela desceu para meu intestino e me causou uma infecção generalizada quando começou a roer as paredes das minhas vísceras.

Essa coisa ficou um tanto “absurda” aos moldes kafkianos e, na dor terrível, entrei em estado de delírio, a febre dominou meu corpo, e fui submetida ao coma induzido...

Minha mente executava viagens surreais arbitrariamente, sem que eu pudesse ter qualquer controle ou qualquer vontade.

Numa tarde seca e fria, com o sol se pondo na janela do hospital, Gregor Samsa metamorfoseado em inseto repugnante me visitou possuído de um sentimento de reação inexistente em sua primeira narrativa. Seu ódio era contra mim. E, com toda a fúria dos titãs homéricos, Samsa invadiu minha segurança como um criminoso incestuoso consciente e orgulhoso de seu pecado.

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Tive uma gestação difícil. Meu ventre abrigou um feto por nove exatos meses durante meu coma induzido... E a lagarta continuava a me devorar viva, enquanto médicos engajados tentavam reconstruir meus órgãos com células-tronco.

Com muita insanidade, alguém que não reconheço acreditou que deveria-se executar o “parto natural”, mas bem no meio do caminho, os problemas se agravaram, sendo então obrigado a usar o fórceps no meu esfíncter vaginal. Embora eu estivesse “anulada” de minha consciência, senti a dor em meio a mais uma das viagens que em meus mais felizes momentos assemelhavam-se a quadros de Magritte.

Muita dor, muita dúvida, muito medo.

Minha mãe, em homenagem ao sentimento mais comum de toda a minha vida, e com muito receio de não ouvir mais a minha voz, deu à minha criança o nome de Tristeza.

10 anos se passaram.

As borboletas ainda viviam e voavam pelos belos jardins do mundo, minha criança já era pré adolescente, e nunca mais voltei a ver Gregor Samsa, após sua segunda visita, que aconteceu depois do parto, na qual ele abriu meu ventre e devorou a lagarta que me aniquilava.

Enfim eu despertei! Acordei de um sono profundo de contos de fadas. Em minhas lembranças, eu sabia que era mãe. Toda magra e debilitada ainda queria sentir o gosto da felicidade e resolvi levar minha bela criança para passear. Por acaso não tão acaso passamos pelo quintal de uma casa em que minhas borboletas estavam a visitar. Minha querida filha Tristeza estava com muita fome e seu prato favorito era borboletas coloridas... De uma só bocada, não vi existir mais nenhum ser alado em meu redor...

Um dia desses, encontrei o moço do violão e contei a ele toda essa história, mas ele não acreditou em mim...

Escrito 1

Existe prazer na dor? Porque só sinto que existo quando sofro? Porque só penso sobre mim quando percebo que não tenho nada e não sou nada? Isso acontece com determinada frequência... Não se trata mais de fases, mas sim de um ciclo constituídos por anéis (ou círculos) dantescos. Mas não chega a ser inferno, pois logo passa; é só ver um sorriso seu que tudo fica bem de novo! Mas poderia ser o sorriso de um outro qualquer... Três pronomes indefinidos na mesma frase: que loucura eu cometo?!?

Eu queria ficar para sempre de um jeito, do mesmo jeito de sempre. Não queria continuar esperando Godot pelo resto de minha vida... Eu quero fazer a prece e partir sem qualquer corda no pescoço.

Comer e dormir: essas seriam minhas únicas atividades se eu fosse uma lagarta. E se eu fosse uma lagarta, eu me metamorfosearia em borboleta num dia qualquer; e se eu me tornasse borboleta, eu poderia voar para algum jardim e escolher a melhor flor.... Mas NÃO! Eu não sou lagarta, nem borboleta, nem flor... eu sou o jardim, o maldito jardim que espera visitas de beija-flor e colibri, mas nem pardal aparece....

Uma coisinha do dia 08/07/2011

Cão e gato

Eu tenho um gato escaldado com medo de água fria e cão que caiu do caminhão da mudança. Os dois se deitam e rolam no meu colam, batendo suas patinhas excitadas nas minhas mãos carinhosas. Eu amo os dois, mas eles são grandes, gordos e peludos, não cabem ao mesmo tempo em mim por causa dum monstro gigante que carregam consigo chamado Ciúmes. E meu amor não sabe para onde vai. Ele migra da capital para o interior se eu estiver em direção oposta. Ele é mesmo um sacana comigo. E eu choro a noite toda sozinha, sem nenhum monte de pelo para aparar minhas lágrimas. Acho que vou dar os dois para a adoção e comprar um peixinho beta...

terça-feira, 26 de julho de 2011

TPM

Eu odeio ser uma maldita humana cheia de sentimentos!
Uma maldita e reles humana que um dia vai morrer e apodrecer como uma carniça fedorenta!
Mas parece que apodreço em vida, com esse infeliz pedaço de carne dentro do meu tórax, desgraçando com todas as minhas possibilidades de ser alguém.
Que desgraça!
Eu posso morrer agora? Pois não estou gostando nada dessa experiência de viver!
Eu odeio tudo! Eu odeio a vida! Eu odeio o mundo! Eu odeio você!

domingo, 10 de julho de 2011

Gato escaldado com medo de água fria

Estou aqui tentando escrever uma prosa poética quebrada para um gato que róe as unhas. No som rola alguma música dos Mutantes e próximos ao meu pé direito gritam para ser lidos “O banquete” e “O amor é um cão dos diabos”. O celular dentro da bolsa sabe que não irá tocar. E o coração tá puto de raiva por não ser como o cérebro que também não consegue mais ser alheio a tudo isso. Gato escaldado porque tem medo de água fria se o que quero apenas é te causar uma febre entre meus braços? Porque você não para de me olhar, meu gatinho selvagem domesticado? E essa cara de que quer ser amansado? Coloque suas garras roídas na minha pele manchada de sol! Seu gato feio!

Adendo do dia 09-07-2011 ao “Gato escaldado com medo de água fria”

Boa noite, meu amor! Durma bem você também...

Depois de ler Charles Bukowski

O gato arisco está preso nas teias da aranha do meu quarto. No meio da noite me assusto com aqueles dois olhos grandes e redondos à minha espreita. Ele não para de me olhar. Ele não queria que eu o prendesse... Agora ele quer se vingar de mim, e no meio do meu banho, estando eu a lavar minhas partes pudendas, ele me ataca com seu olhar devorador. Ele não me deixa dormir, e fica a noite toda cantarolando na minha cabeça: “Hey Hel, você é uma garota má, você merece isso”.
O gato arisco passa a noite chutando pedrinhas no asfalto ou lendo “O amor é um cão dos diabos”, enquanto eu o mantenho preso nas teias da minha erudição... Ele é um gato escaldado com medo de água fria.